Apontamentos para a
história de Viseu

Sobre os rendimentos do bispado no séc. XVII

António João Cruz

O pouco que se sabe sobre o clero viseense diz respeito aos seus mais altos elementos. O que sobre estes se dispõe bem pouco é, no entanto: os dados são escassos como são fragmentários. Por isso, ao se falar dos rendimentos do bispado de Viseu e seu bispo mais são as questões que se levantam do que as conclusões que se firam.

Em 1632 as rendas do bispado de Viseu orçavam os 78.400 cruzados, ou seja uns 4% das receitas do estado português excluídas as do Oriente. Ao bispo pertence 1/4 desse valor; os restantes 3/4 como se distribuíam? Questão sem resposta. Do mesmo modo se desconhece a proveniência dessas renda. Que elas eram constituídas sobretudo pelos dízimos (1/10 da produção), pelas primícias, inicialmente voluntárias e que na Constituição Diocesana de 1681 surgem como obrigatórias (1/40, 1/30 ou mais, conforme o hábito, dos primeiros géneros), pelas lutuosas (a melhor peça de cada pessoa que morra ou I marco de prata), pelas doações e ofertas e pelas rendas fundiárias – a propósito das quais escreveu M. Aragão que, a partir de 1213, ano em que o prelado fez uma concordata com o Cabido, as propriedades da Sé «foram crescendo muito mais a ponto de não haver no século XVII palmo de terra em volta da cidade em que não estivesse imposto foro ou censo em favor da mitra ou do cabido» – é facto conhecido. Mas o seu peso específico, que bem importaria determinar, é totalmente ignorado.

Assim não sucede relativamente a meados do séc. XIX: em 1850 dos 29 milhões de réis das rendas do bispado, 24% provinham de foros, 26% de esmolas e doações e 50% da côngrua. O total representa uns 2/3 das receitas de todas as câmaras municipais do distrito.

Ignoram-se os quantitativos elas rendas do bispado no séc. XVII – excepção é o referente a 1632 – mas dispomos de algumas estimativas dos rendimentos dos prelados :

Data
Cruzados
% relativamente ao total das rendas dos prelados portugueses
Meados do séc. XVI
+ 8.000
-
1615
15.000
6,4
1632
19.000
6,3
1639/40
16.000
5,1
Reinado de D. João IV (1640/56)
19.000
5,4
1674
18.000
-
1685/90
20.000
-
Fins do séc. XVII
(depois de 1694)
45.000
-

Evidentemente que são números redondos e que só corno ordem de grandeza podem interessar. Através deles assiste-se a um decréscimo das rendas do prelado viseense relativamente aos restantes, pelo menos até meados do século. No entanto, tais valores não se encontravam muito afastados dos disponíveis para 1320-21. Nessa ocasião os rendimentos do bispo viseense rondavam os 6,9% do total das rendas dos prelados portugueses e representariam 22% do total das da diocese.

Até que ponto tais valores traduzem um decréscimo das rendas do bispado (se comparadas com as dos outros)? A isto se verificar, que causas se poderiam buscar para essa decadência? Olhando para o que se passa nas outras dioceses do reino verifica-se ser esta descida comum a Évora, Lisboa, Coimbra, Viseu e Lamego, enquanto o Porto, Leiria, Elvas e Portalegre se mantêm com algumas oscilações nunca situação quase estacionária. Aparentemente tal quadro sugere que tais movimentos foram tendentes a tornar menos desnivelados os rendimentos dos diferentes prelados – dos que subiram apenas o de um, o de Braga, se mostrava superior ao menor dos que desceram. Mas até que ponto tal é verdade? E a sê-lo, como se processou?

 

Referência bibliográfica:

António João Cruz, «Sobre os rendimentos do bispado no séc. XVII», A Voz das Beiras, 399, 13-5-1982, pp. 2, 10.

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