Apontamentos para a
história de Viseu

Sobre os achados arqueológicos da Rua das Ameias

António João Cruz

Na edição do 7 de Setembro noticiava-se, em título deste jornal, a descoberta, em Viseu, dos «testemunhos arqueológicos mais antigos da cidade». No artigo referiam-se os «vestígios das mais antigas estruturas arquitectónicas até agora encontradas nesta cidade», elementos «de um muro romano e de um grande edifício público, com lajeado da mesma época, bem como, num piso superior, de uma estrutura que parece corresponder a uma capela paleocristã».

Esse trecho da notícia sugere-me os seguintes comentários:

1. Os mais antigos testemunhos arqueológicos até ao momento encontrados na área da actual cidade do Visou consistem em alguns machados neolíticos (cf. Beira Alta, 45(1-2), 1986, pp. 153-4).

2. De origem romana existem em Viseu as estruturas arquitectónicas, há muito conhecidas, da Cava do Viriato.

3. No n.º 259, do 30 de Junho de 1934, do jornal Distrito de Viseu, José Coelho descreveu o corte estratigráfico por ele observado «à Praça de Camões (hoje Largo de D. Duarte), entrada da Rua das Ameias, distante cerca de 1,5 m da muralha (...), no sítio onde esteve a casa da guarda» e onde «mandou a Câmara construir uma cisterna para depósito de águas». Aí, diz que «a menos de 1 m de profundidade começa a aparecer pedra com aparelho romano bem característico, à mistura com muita cerâmica - principalmente tégula, imbrex e tijolo —, restos de construções luso-romanas» e que a «1,15 m de profundidade encontra-se o pavimento de uma construção (...). Era um pavimento, com 0,1 m de espessura, de argamassa dura feita de cal, pedaços de tijolo e areia, com grande consistência».

Em conclusão, é falso o título do referido artigo; é abusiva a referência às «mais antigas estruturas arquitectónicas até agora encontradas»; é do domínio público, há mais de meio século, que na zona da rua das Ameias existiram estruturas de origem romana; é lamentável que o nome de José Coelho seja utilizado para colóquios mas, quando na realidade deveria ser lembrado, seja completamento ignorado (estranhas homenagens!).

Refere-se ainda nesse artigo que Jorge de Alarcão deslocar-se-ia ao local «afim (sic) de dar o seu parecer sobre estes importantes achados». Se é verdade o que diz o redactor dessas linhas, lamenta-se profundamente que as ditas escavações se tenham entretanto desenrolado sem o acompanhamento do professor de Coimbra, uma vez que, pelas palavras citadas, até esse momento parece ter faltado uma caução superior.

 

Referência bibliográfica:

António João Cruz, «Sobre os achados arqueológicos da Rua das Ameias», Notícias de Viseu, 730, 19-10-1988, p. 2.

Artigo em formato pdf (versão publicada)

Artigo revisto de acordo com o original dactilografado.